Eugenia Melo e Castro

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Um dos bilhetes do kaos

E os artistas? Ah, estes, num futuro remoto
comandarão tudo. Serão (o que já são) os
mandarins, com toda a plenitude e força que
a técnica colocará em suas mãos. No fim, só
os artistas mandarão. É que a Humanidade
andará sedenta de fantasias, sonhos, mitos,
miragens, (que não são mentiras nem
alucinações, mas a representação poética
da vida do homem), de um novo sentido
religioso. E ai, os artistas serão os novos
sacerdotes. Apertando os botões das
grandes máquinas, o mundo inteiro viverá
na grande tragédia que todos escreverão.
Porque todos serão artistas.
Jorge Mautner

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Pra não dizer que não falei da noite de 67

O diretor francês Jean-Luc Godard chegou a declarar que documentário é a verdade em 24 quadros por segundo. Grande mentira. Por mais verdadeira que seja a captação, as imagens passarão pelas mãos do montador, este sim, autor da “verdade” exibida. Quem conhece os segredos da edição sabe que uma cena ou seqüência pode ser manipulada para o bem ou para o mal com simples inversão de uma frase ou supressão na edição final da pergunta que motivou a resposta editada. O documentário sobre aquela noite em 67 mostra o ponto culminante de um processo iniciado por mim anos antes com o objetivo de promover nova geração de compositores músicos e cantores que não encontravam espaço na mídia. Artistas que traziam propostas musicais e estéticas mais modernas, mais apropriadas a uma também nova platéia que encontrava naquela música eco mais coerente com sua cultura e anseios do que era servido pelo radio e televisão de então. Esse processo tinha a Bossa Nova como êmulo. O primeiro Festival Nacional da Música Popular Brasileira, de onde sai a sigla MPB, conseguiu abrir as portas da televisão para o elenco que teve Elis Regina com Arrastão de Edu Lobo e Vinícius de Moraes como catalisador. Não aproveitado pela TV Excelsior encontrou abrigo na Record. Contingências acidentais, como o incêndio que destruiu os estúdios, obrigaram a que toda programação fosse gravada “ao vivo” no Teatro Record Consolação. Foi oportunidade para exercitar o poder daquela música. Palco e platéia, cuja reação provou ser a música popular alternativa às novelas que já registravam grandes índices de audiência. Depois do Festival de 66 a programação musical da Record a colocou no primeiro lugar. Ainda no Festival de 1966, por sentir seu potencial, aconselhei Vandré que olhasse com carinho para a moda de viola. O resultado foi Disparada. No documentário Uma Noite em 67, minha participação se resume a frase que revela preocupação em fazer bom programa de televisão. O que era óbvio, mas, seu sentido fica distorcido se suprimido o contexto, não editado, que trazia a pergunta: “Naquele momento você sabia estar fazendo história?” Omissão que transforma e diminui a importância e até a própria razão daqueles eventos. O filme mostra o momento e o depois. Falta um antes, cujo teor, embora sido registrado nas quase 12 horas gravadas na minha casa, não foi utilizado na versão final. Falta o relato de meus papos com Caetano Veloso e Guilherme Araújo, então seu empresário, em prolongado jantar no então Deck da Av. 9 de Julho, sobre a necessidade da MPB deixar de lado sua temática campestre/praieira e olhar para as cidades e seus motivos urbanos, de acordo com o que acontecia naqueles tempos de “Lucy in the Sky with Diamonds” aos quais a “Alegria...” do Caetano, contrapôs “...sem lenço e sem documento” que pedia instrumentos elétricos. Das tardes onde Chico de Assis, Rogério Duptrat e eu tentávamos fazer com que os “The Six Sided Rockers”, em seguida Mutantes, tocassem moda de viola em suas guitarras. O caminho escolhido por Renato Terra e Ricardo Calil resultou num bom trabalho, mas para quem escreveu aquela história faltam algumas verdades.
Solano Ribeiro/ 2010